5.23.2006

(z) Zanzibar



E como "não há duas sem três", Zanzibar! - é o nome do terceiro álbum de João Afonso, um autor/compositor/interprete notável.
É uma grande injustiça ser sobrinho de José Afonso. Não o digo por inveja (será?), mas antes porque são inevitáveis as comparações e, talvez por isso, João Afonso não tenha o lugar que lhe pertence por direito próprio na música portuguesa.
São dele algumas das mais belas canções que conheço. Canções com alma, numa voz dolente, quente, que me fazem "perder o sentido das coisas" e recordar as paisagens, as cores e os cheiros de África, onde nunca fui nem onde nunca me perdi.
A música portuguesa continua singular e valiosíssima, longe das capitalizações bolsistas e arredada das playlists que comandam as rádios, mas contudo aqui tão perto, tão à mão. Se quiseres podes tocar(-lhe). Basta que queiras.


Clandestino (cá e Lá)
(letra e música: João Afonso Lima)

Eu sou como um marinheiro, que tropeça junto ao mar
sou como um olhar cigano à volta do teu olhar

Não tenho sempre razão não serei bom inquilino
saudades só de onde em onde, não tenho pátria nem hino

iôiô... quem se perdeu, encontrou
quem partiu também chegou
clandestino cá e lá
sem saber se algum Deus há

Pelos cantos da cidade desenhei a minha casa
construía-a sobre as dunas que ficam na maré vaza

Sou como sou
basta-me o vento
leva-me a onda
tudo o que tento

Sou como sou
onde me ausento
basta-me a festa
chega-me o vento

Eu sou como um embarcado, tão depressa chega e vai
a partida é meu destino, quando a noite quente cai

5.04.2006

(x) Ximenes (x) Xanana




Nos dias que correm, incertos, somos tentados a valorizar os defeitos e os erros, e a substimar os gesto de coragem e de altruísmo. Lembro hoje dois homens que são dois exemplos de vida, duas faces da mesma moeda cunhada por tributo ao amor que ambos revelaram à sua terra e ao seu povo. Foram capazes de fazer a guerra para terem a paz, foram capazes de viver subjugados para alcaçarem a liberdade. Não acredito que não tenham vacilado, que não tenham tido a tentação de desertar, por um momento, por uma fracção de segundo. Mas as suas divisas foram a reserva mental e o alento que os levou à conquista - "amai-vos uns aos outros", "resistir é vencer" - são os sinais que adivinho nos seus olhos e o que admiro nos seus gestos.
Bem melhor seria o mundo se lhes seguissemos o exemplo e fossemos nós também capazes de fazer a guerra e sair deste torpor comodista que nos consome a vida.

(letra e música F. Gomes)



o dia amanhece
como um dia vulgar
nas ruas corre o sangue
dos que vieram
celebrar a noite
que é a cor da face
dos que tombaram
mas que não morreram
dos que tombaram
mas que não morreram

ouvem-se as vozes
dos que não calaram
que o corpo é igual
e que a alma sente
quando a morte vem
não escolhe a côr
e o chão que pisam
não é diferente
e a terra que pisam
não é diferente

(refrão)
mas há quem
da liberdade faça uma bandeira
mas há quem
p’la liberdade passe a vida inteira
sem o sol, sem o céu,
mas com a vontade
de que um novo dia nasça,
de que um homem novo nasça,
em liberdade