3.27.2010

"Um concerto no Sport Operário Marinhense"





Em vésperas do 25 de Abril, e à parte algumas imprecisões, um testemunho sobre Zeca Afonso publicado no blog da AJA.


"Passaram 23 anos após a morte de Zeca Afonso. Em 23 de Fevereiro de 1987, após uma dura luta contra a grave doença que o atormentava, viria a sucumbir no leito do hospital.
Muito já se disse do Homem, Poeta , Cantor e Compositor. Porém, nunca será de mais realçar o seu culto da amizade ao próximo, a solidariedade para com os mais desfavorecidos, a busca constante da liberdade para o seu Povo, bem presente nas suas canções.
Foste um "guerrilheiro" em que as tuas armas eram poemas e o ribombar dos teus canhões eram os sons das tuas baladas, entoadas em uníssono pelas multidões que te adoravam e adoram.
A censura e a repressão do antigo regime nunca te conseguiram calar. É de assinalar a ridícula acção da polícia política que em vésperas do dia 1º de Maio, te prendia preventivamente, para evitar que fosses fazer acções de canto livre junto das camadas trabalhadoras. Passada aquela data eras posto em liberdade.
A falta de liberdade antes de 25 de Abril de 1974, põe a ridículo as alegações caricatas de uns quantos políticos actuais que hoje apregoam não haver actualmente em Portugal liberdade de expressão. Onde está a censura prévia que cortava textos quase inteiros, a ponto de, o que restava, não ter qualquer sentido? Onde estão as prisões efectuadas nas madrugadas de hoje sobre aqueles que são de opinião política diferente do governo?
Tu, Zeca, para conseguires iludir os censores, em geral coroneis reformados, bordavas os teus poemas com expressões figuradas de simbolismos sub-reptícios de rara beleza.
Por falar em liberdade, lembro-me de um episódio a que felizmente assisti e que me marcou profundamente.
Decorria o ano de 1970 ou 1971. Foi publicitado que se iria realizar no Sport Operário Marinhense, pelas 21H30, uma sessão em que iria actuar José Afonso, Adriano Correia de Oliveira e outros de que não recordo o nome. O evento gerou logo grande expectativa na juventude marinhense.
A sala estava repleta. Ao fundo do palco um grande cartaz com as primeiras letras de "Roseira brava, roseira...".
O espectáculo estava para começar quando chegaram elementos da polícia política- D.G.S., com ordens para proibir o evento. O ambiente da sala estava pesado, o nervosismo era visível nos rostos dos presentes. Zeca e Adriano percorriam o corredor entre as cadeiras, de um lado para o outro.
Um prestigiado médico local que se encontrava na sala como espectador, endereçou uma mensagem ao Governador Civil de Leiria, tomando a responsabilidade em como o espectáculo decorreria normalmente, sem alterações de ordem pública.
Mais uma espera e seriam talvez umas 23 horas quando veio a resposta: A sessão estava proibida!...
Não havendo mais nada a fazer, tu Zeca, dirigiste-te aos presentes e disseste: "Só nós estamos proibidos de cantar, vós não!... Sendo assim, cantem vocês para nós!..."
Então, perante os agentes atónitos, foi realizada uma sessão inesquecível em que, uma plateia em coro, interpretou um desfilar de canções cujas letras todos sabíamos de cor.
Hoje, constato com alegria que não só a minha geração, mas também os vindouros te admiram e essa é a maior prova da tua imortalidade."


Carlos Rocha Oliveira


3.14.2010

(g) Giz


risco a traços de giz
sóis e luas, círculos
casas e rios
rabiscos
oh… enganei-me…
apago e volto a riscar
árvores frondosas de raízes grandes e profundas
papagaios de papel
o arco íris
o vento soprando as velas de um barco
as primeiras letras
os números, as derivadas,
os logaritmos
projectos
ideias
perenes?
não!
a magia do giz é o pó…
como eu e tu
como nós