7.20.2009

"O homem; as viagens"

Hoje ouvi na rádio este poema. Não o conhecia. Confesso até que conheço pouca poesia. Mas a voz e a expressividade (únicas) de Fernando Alves (TSF), fixaram-me a atenção nas palavras. Nem por acaso. Ainda ontem comentava com um familiar: como é possível que o homem consiga feitos tão extraordinários, avanços tecnológicos sem paralelo e não consiga resolver um dos problemas mais básicos da humanidade, a pobreza.
O Homem chegou à lua há já 40 anos…



O homem, bicho da terra tão pequeno
Chateia-se na terra
Lugar de muita miséria e pouca diversão,
Faz um foguete, uma cápsula, um módulo
Toca para a lua
Desce cauteloso na lua
Pisa na lua
Planta bandeirola na lua
Experimenta a lua
Coloniza a lua
Civiliza a lua
Humaniza a lua.

Lua humanizada: tão igual à terra.
O homem chateia-se na lua.
Vamos para marte — ordena a suas máquinas.
Elas obedecem, o homem desce em marte
Pisa em marte
Experimenta
Coloniza
Civiliza
Humaniza marte com engenho e arte.

Marte humanizado, que lugar quadrado.
Vamos a outra parte?
Claro — diz o engenho
Sofisticado e dócil.
Vamos a vênus.
O homem põe o pé em vênus,
Vê o visto — é isto?
Idem
Idem
Idem.

O homem funde a cuca se não for a júpiter
Proclamar justiça junto com injustiça
Repetir a fossa
Repetir o inquieto
Repetitório.

Outros planetas restam para outras colônias.
O espaço todo vira terra-a-terra.
O homem chega ao sol ou dá uma volta
Só para tever?
Não-vê que ele inventa
Roupa insiderável de viver no sol.
Põe o pé e:
Mas que chato é o sol, falso touro
Espanhol domado.

Restam outros sistemas fora
Do solar a col-
Onizar.
Ao acabarem todos
Só resta ao homem
(estará equipado?)
A dificílima dangerosíssima viagem
De si a si mesmo:
Pôr o pé no chão
Do seu coração
Experimentar
Colonizar
Civilizar
Humanizar
O homem
Descobrindo em suas próprias inexploradas entranhas
A perene, insuspeitada alegria
De con-viver.


Carlos Drummond de Andrade

1 comentário:

Bruno Monteiro disse...

Os nossos líderes há muito que nos enganam com este ou aquele "Programa Humanitário", que nunca é mais do que uma passagem na procura de um outro qualquer interesse.

A verdadeira luta pela pobreza e igualdade não está de forma alguma na lista de interesses dos senhores.

A luta pelo poder jamais deixa espaço para o aparecimento de uma verdadeira caminhada contra a pobreza.

Vim espreitar :)!

Abraço,
Bruno