11.23.2006

(l) Lua

Mirei-te, de soslaio. Mirei-te, novamente. Uma e outra vez. Até já me tinha esquecido de ti aí em cima. Mas não sou o único! Contemplar-te com vagar é um luxo que há muito não experimento. Talvez quando os dias acalmarem. Talvez. Até lá, não te eclipses, não te vás. Continua a marcar os partos, a fazer companhia às serenatas, crescente, decrescente, minguante, cheia, pouco importa, desde que permaneças no teu lugar à minha espera.



Soneto da Lua

Por que tens, por que tens olhos escuros
E mãos lânguidas, loucas, e sem fim
Quem és, quem és tu, não eu, e estás em mim
Impuro, como o bem que está nos puros ?

Que paixão fez-te os lábios tão maduros
Num rosto como o teu criança assim
Quem te criou tão boa para o ruim
E tão fatal para os meus versos duros?

Fugaz, com que direito tens-me pressa
A alma, que por ti soluça nua
E não és Tatiana e nem Teresa:

E és tão pouco a mulher que anda na rua
Vagabunda, patética e indefesa
Ó minha branca e pequenina lua!

Vinicius de Moraes



e o meu contributo
(letra e música Filipe Gomes)


só por ti na noite, procurando em vão
um porto seguro na escuridão
não tenho medo que os baixios
me façam naufragar
só por ti eu ia a qualquer lugar

a Lua aparece, o temporal se acalma
e sinto um vazio cá dentro, na alma
cansado de ter resistido
não sei como sobrevivi
pouco depois adormeço pensando em ti

......o corpo como que morreu
......a alma como que partiu
......tu foste o lado da Lua
......que mais ninguém viu

sonho com o vento,

sonho com o mar
e algo me diz que te hei-de encontrar
talvez a próxima maré traga sinais de ti
e o vento me conte o que não vi

o Sol já vai alto, sinto-me acordar
por mais que procure não consigo encontrar
nem o barco em que naveguei,

nem o farol que me guiou
nem o meu amor que o mar me roubou


1 comentário:

Anónimo disse...

Atrasadote, mas cá vai, mesmo assim, um comentário...

Li o teu texto, Filipe, e fiquei a pensar, com os meus botões, que esta vida que levamos é uma parvoíce pegada!...
Concordo com a ideia que expressas: nem tempo nos resta para admirarmos a Lua!!
Penso poder concluir, das tuas palavras, que não é olhar a Lua só por olhar. Não é para nos inspiráramos para um qualquer poema que faça jus à ideia que a Lua é dos poetas e que dela lhes emana grande parte da inspiração… (e o teu poema e o de Vinícius de Moraes são bem a prova disso, ainda que a metáfora seja a chave das palavras!...). Não, eu refiro-me à observação e apreciação da Lua como exercício telúrico, como forma de vivermos a vida primordial!... Ver a Lua espelhando-se nas ondas do Oceano sem fim!...
Termos a possibilidade de, olhando a Lua, pensarmos na nossa pobre dimensão humana!…

É assim que eu me vejo, infelizmente muito menos do que gostaria que acontecesse, quando me perco a olhá-la… E como é reconfortante esse exercício! Não posso estar mais de acordo contigo no lamento do pouco tempo que lhe dedicamos. A ela e a uma infinidade de outras pequenas-grandes coisa da vida!...